sábado, 21 de março de 2015


Vou ter que fazer com meus filhos

            Acho que essa foi uma das maneiras mais cálidas que já vi de demonstrar amor por uma criança: mantê-la o maior tempo possível no mundo da imaginação.
            Tolkien, além de proporcionar a nós, meros estranhos, a possibilidade de sonharmos com mundos inimagináveis, com elfos, anéis mágicos, dragões e hobbits, ele criou para seus filhos um universo próprio, criativo e tão mágico quanto, mas com o Papai Noel nele.
            Hoje, com a banalização que as datas festivas assumiram, reduzidas a dias para se dar presentes, uma inciativa como essa é memorável. Tolkien, através da lareira da casa, criou um canal de comunicação entre os filhos e os seres que habitam o Polo Norte Imaginário. Ele se passava pelo próprio Papai Noel, pelo Urso Polar e seus sobrinhos, pelos elfos das terras geladas, para conversar com os filhos sobre, sim, seus presentes desejados, mas também sobre a importância do Natal, as cruezas da guerra, os problemas financeiros da família, o amadurecimento pela idade que chegava. Com muitas ilustrações - que jamais serei capaz de fazer para meus filhos – o autor possibilitou que suas crianças ficassem alguns minutos a mais ao longo do ano e de suas vidas num mundo só delas, para o qual só a infância tem a chave.
            Ele criava uma letra própria, tremida de frio, para o Papai Noel, outra com muitos erros ortográficos para o Urso e mais uma, caprichada, para o tão organizado elfo. Tudo para esconder a semelhança com a sua e manter a ilusão. Suas cartas são repletas de aventuras, trapalhadas dos funcionários, invasões de inimigos, linguagem em código e tudo o mais que uma criança amaria.
            Por mais que os irmãos fossem crescendo e descobrindo as horríveis verdades de um mundo sem magia, Tolkien continuava se correspondendo com os filhos menores e sem nunca deixar de mandar lembranças e beijos aos que já haviam crescido. Manteve a tradição da lista de presentes, da carta que deveria provar o merecimento deles, das meias penduradas pela casa e da lareira como um pombo-correio.
            O livro é incrível. Inspirador. Esperançoso. Uma luz no fim do túnel para pais frustrados com a impessoalidade da nossa mídia, da nossa economia capitalista, dos livros sem magia.

COM CERTEZA aplicarei o experimento aos meus filhos. Mas os desenhos vão ter que ficar para uma outra vida.
Escrito por Unknown Data: 3/21/2015 10:48:00 AM 1 comentário LEIA TODO O TEXTO!

Um estranho no ninho

            O “Memórias” é uma antítese ambulante. Primeiro, porque não são memórias. Nosso narrador é em terceira pessoa e nada tem a ver com a história. Não é personagem. Nem viveu no tempo delas. Ele narra a história das peripécias de Leonardo e sua trupe mais de 20 anos depois do ocorrido.
            Segundo, o livro está inserido na escola romântica, por ter sido escrito nesta época, mas não compreende um romance romântico propriamente dito. Ele é um patinho feio. Uma exceção. Manuel Antônio de Almeida o escreveu por precisar de dinheiro para manter a família que, além de ser de classe média, era órfã do provedor, o pai. O autor cursava medicina e contribuía com o jornal “Correio Mercantil” no caderno dominical bem humorado e liberal, “A Pacotilha”. Por isso, talvez, o livro se mostre tão satírico assim: para atrair maior público e pelo local em que era impresso como folhetim.
            Não há qualquer tipo de idealização, nacionalismo ou sentimentalismo exagerado, comuns ao Romantismo. Os exageros talvez apareçam para tornar as cenas engraçadas, mais ainda assim, bastantes características da primeira metade do século XIX.
A classe média é colocada em cheque e vira, pela primeira vez, objeto de análise. Por isso o livro é por muitos chamado de romance documental, histórico, caricatural ou episódico. Nele, as festas, procissões, batizados, costumes, vestimentas, linguagem, locais comuns e valores desse estamento social são expostos de uma maneira muito divertida, sem realmente fazer uma crítica a eles. Um tanto quando a la Alencar, ao retratar essas mesmas características do interior do Brasil em “Til”, mas sem todo o nacionalismo e enfoque à natureza. As outras classes sociais são completamente excluídas. Negros aparecem como mero ornamento decorativo e não recebem o olhar crítico ou humorístico do autor. O mesmo se dá com a elite, que não é nem sequer citada, a não ser pela D. Maria, a personagem mais bem posicionada economicamente na história.
Por ser caricatural, suas personagens são planas: não evoluem ao longo da história; e também, tipo: representam um grupo social e não um indivíduo em particular. Por isso muitas delas não têm nome, ou sobrenome. E todas elas sambam na corda que ora pende para o lado da ordem, da lei, da bondade; ora para o lado da desordem, da corrupção, do jeitinho brasileiro e da vingança. O livro, portanto, não é maniqueísta. É sim um retrato de grupos característicos de uma certa sociedade, sem qualquer tipo de embelezamento.
Vamos, ao longo da leitura, acompanhando a vagabundice de Leonardo, o dedo podre para o amor de Pataca, a timidez de Luisinha, as chatonices da vizinha, a inocência do padrinho, as fofocas de D. Maria e da comadre, as perseguições de Vidigal; mas tudo num fio cronológico, porém pouco conectado entre si. O enredo parece ser muito tênue e desimportante, pois as cenas, os episódios são muito mais significativos para o propósito do autor.

O livro é interessante, possui uma linguagem acessível. Mas é raso. 
Escrito por Unknown Data: 3/21/2015 10:23:00 AM Comente! LEIA TODO O TEXTO!

sexta-feira, 20 de março de 2015


Tomates

Tomates. Vermelho. Amargo. Vida. Amarga. Tomate. Madrasta. Amarga. Partida. Triste. Tomate. Família.
Não vejo melhor maneira de descrever esta obra. Mas que coisa incômoda!
Descobri que o tinha na prateleira no susto. Estava tentando organizar a fila de livros não lidos – que, por sinal, é impossível de ser organizada já que muda conforme o humor, o período do mês, o tamanho do livro, a tara e a preguiça -, e percebi que “Vermelho amargo” estava na estante. Não me pergunte como ele foi parar ali.
Já que havia visto vários blogs no último mês comentando sobre ele, e também por ele ser fininho, decidi dedicar meu sábado a ele. Peguei o volume de capa dura, que se assemelha realmente à madeira, o que até dificulta seu manuseio. Sentei no sofá e encarei as letras tão vermelhas quanto a capa. E fui embora. Sem conseguir parar até terminar as míseras – porém intensas – 60 páginas.
O livro é mais um conto que uma novela ou romance. Mas tem uma densidade inusitada para tal gênero. É mais lírico que narrativo. E que poesia! Que linguagem! Toda definição de prosa poética se encontra nele.
Uma família. Muitas partidas. Uma nova mãe. Muita tristeza. E muitos... tomates. Eles compõem toda a metáfora de dor, abandono, partida, saudade, tristeza e substituição que o livro retrata. Lógico que teria que ser um tomate, comida odiada por metade das crianças do mundo, inclusive por aquela que nos narra a história. E quanta tristeza e quantos tomates para uma criança só.
Infelizmente é impossível falar muito sobre esse livro, assim como é impossível falar sobre um poema plenamente. Ele tem que ser lido.

Então mãos a obra!
Escrito por Unknown Data: 3/20/2015 09:06:00 PM Comente! LEIA TODO O TEXTO!

Na mosca
       
       Sabia que iria gostar dele mesmo antes de tê-lo comprado. Vi a release do livro no Facebook, numa divulgação da própria Cia das Letras e não esperei nem 2 minutos para automaticamente entrar nos sites de livrarias em que costumo fazer compras para pesquisar o preço. Como achei um tanto quanto caro, decidi esperar.
Mas confesso que não durou muito a espera. Sabe aquela coceirinha na mão? Pois é. Fui a uma livraria física no fim de semana e tive que ver o livro com as mãos. E aí tudo se explicou. Ele é grande, grosso, com papel de boa qualidade, muitas imagens e capricho maestral. Vi que valia a pena o preço e comecei a ler logo na livraria, tomando um café e comendo um bolinho.
Saí de lá lendo o livro e acho que não parei mais até tê-lo terminado, coisa que fiz em uma semana, creio eu. Por isso acho que não há definição melhor do que aquela que já está na capa do livro, que ele corresponderia a uma caixa de bombons literários, porque ele é simplesmente viciante. Você lê uma carta e fala, “ah, vou ler só mais uma”, e, quando viu, já leu mais quatro.
As cartas são tão diversas em forma, época de escrita, temática e linguagem que o livro nunca cansa – a não ser o braço por ficar segurando esse trambolho de um quilo. Há algumas inusitadas, que te fazem pensar: “Sério que tem gente que faz isso?”, “Sério que as pessoas realmente mandam cartas para o presidente?”, “Sério que aquele artista responde as cartas das fãs?”. Porém há outras que não mudaram em nada minha vida, nem sequer chamaram minha atenção. Mas elas são bem compensadas.
Algumas das cartas vêm com seus respectivos fac-símiles. Outras com ilustrações da editora, com fotos do interlocutores, ou da situação em si, ou da época. Mas o mais importante talvez seja o box de informação que aparece ao lado da carta, dizendo quando, onde, por quem, para quem e sob qual circunstância a carta foi escrita. Sem isso, muitas delas não fariam o menor sentido, pois o contexto é elementar para seu entendimento.

Há cartas de fãs para o Elvis; do Elvis para o presidente dos EUA; dos descobridores da fita dupla de DNA; a carta suicida da Virginia Woolf; outra de grandes escritores para outros grandes escritores esculhambando seus trabalhos; de artistas para seus fãs; de pessoas comuns indignadas com a situação do país, da guerra; de pais para seus filhos com mensagens realmente tocantes; de pessoas vivas para pessoas mortas... ah... há bombons de todos os sabores.
Escrito por Unknown Data: 3/20/2015 08:51:00 PM 2 comentários LEIA TODO O TEXTO!
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