Uma
coisa chamada “criatividade”
O livro
“Cidade dos Ossos” é o primeiro volume de uma saga enorme, que ainda não acabou
de ser lançada, chamada “Os instrumentos mortais”. Neste romance, somos
apresentados a um mundo fantástico e a personagens nem tão fantásticas assim.
Primeiro,
descobre-se no livro que o nosso mundo é, na verdade, habitado também por
criaturas descendentes dos demônios – vampiros, lobisomens e afins - e por
seres escolhidos e privilegiados pelos anjos – os Caçadores de Sombras -, e
ambos disputam esse nosso universo e nossas vidas mundanas num grande cabo de
guerra. Como todo esse mundo é novo para o leitor e para a protagonista,
espera-se que ele seja explicado aos detalhes e com muita paciência já que não
temos a obrigação de compreendê-lo previamente. Mas as descrições e narrativas
que deveriam desnudar esse universo para nós parecem feitas com pressa, como se
a escritora, único ser no planeta que conhece essa história aos detalhes,
estivesse de saco cheio de falar sobre o assunto que só pra ela é óbvio. Muitas
regras não são explicadas com clareza, informações ficam implícitas, ou só são
ditas quando você já está confuso, sem entender nada há umas 20 paginas, no
meio da batalha do século.
O problema
da escritora não para por aí, pois os diálogos, além da narrativa, também são
caóticos. Cassandra Clare não sabe ser onisciente nem fazer discurso indireto
livre. Há muitas falas seguidas entre personagens diferentes e você nunca sabe
quem está falando o quê, porque a autora se esquece de nos avisar. Ou o assunto
do diálogo é trocado aleatoriamente, porque você não conhece nem as personagens
nem o mundo deles direito, e fica se sentindo no meio de uma pintura dadaísta.
Daí temos
que as personagens também não são lá aquelas coisas em termos de construção e
verossimilhança. A Clary, nossa protagonista, é mais sem caráter que a Bela do “Crepúsculo”,
mas não por ser malvada, mas por não ter consistência. A Bela, pelo menos, é
uma songa-monga o livro todo, mas a Clary não; tem horas que ela é valente,
outras um coxinha, outras ela é engraçada, outras uma boba. E sempre nas horas
erradas! Há o momento para ela ser boba, mas NÃO, ela quer ser engraçada e faz
a piada no meio de uma perseguição, em que 1437 vampiros estão correndo atrás
dela. Ou ela podia ser fofa e meiga, mas ela resolve dar um soco na cara no
mocinho aleatoriamente. OMG! E os outros não fogem muito disso não. O cara mais
arrogante do mundo se torna uma borboleta de fofura porque escutou uma
mentirinha mal contada pelo vilão; há um personagem gay que não traz
complexidade alguma para a história: o homossexualismo não é discutido, ele não
faz nada ao longo do livro todo e só a mocinha sabe que ele é gay e sei lá Deus
como ela descobriu, pois a escritora – de novo – não nos deu indícios algum.
A única
personagem que realmente me agradou foi o Simon, o melhor amigo da Clary, que é
mundano e está feliz assim, pois não foi corrompido pela magia. Ele quebra o
paradigma mitológico, pois não deixa que a fantasia decida seu destino; ele
toma as rédeas da situação e luta contra profecias, mágicas e poderes especiais
apenas com sua determinação e caráter. Ele nos dá certa alegria ao vermos que
nós, leitores mundanos, temos sim livre arbítrio e direito de decidirmos nosso
destino por nós mesmos se quisermos. Nada como fazer uma banana para a “Ilíada”
e para “Os Lusíadas” e tomar posse de nossas próprias vidas.
Bom, a
historinha é interessante, mas é impossível não detectar uma leve “inspiração”,
da qual a escritora se valeu, em cima de "Harry Potter". Há cópias explícitas
como: 1. um vilão que deseja fazer uma limpeza de sangue à lá Hitler; 2. o vilão
só aceita ser chamado de Lorde; 3. há um pacto de sangue, em que, se a promessa
feita for quebrada, a pessoa morre; 4. um menino se transformando em rato (sério...
tem tantos bichos no mundo! Papagaios, lagartixas, hipopótamos, ácaros, tigres,
minhocas, periquitos...); 5. falas inteiras e até cenas semelhantes.
Fiquei brava.
Para se fazer literatura fantástica, você precisa ter uma coisa chamada criatividade,
que pressupõe a não necessidade do plágio, pois só sua cabeça dá conta... E ela
não pode ser a mesma que se usa para inventar histórias sensacionalistas sobre
a Paris Hilton – como a escritora costumava fazer na revista estilo “Titi” em
que trabalhava -, um romance com seres mágicos exige um pouco mais.
Só vou
ler os outros se ganhar de presente – fica a dica! – e se a autora parar logo
de escrever essa série, que toda hora ganha um livro novo; pois ela mesma falou
que os personagens não são imortais, então: Chega logo no final, senão vai
ficar chato que nem “Smallville”.
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